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JUSTIÇA #11
Ao comentar a 10ª edição da série Justiça, mencionei ser aquela a mais eletrizante até o momento. Bem... não é mais. A 11ª parte da inesquecível saga criada por Ross, Krueger e Braithwaite não concede ao leitor um instante sequer de tranqüilidade, pois todas as suas páginas, sem exceção, são recheadas de cenas de ação tão intensas quanto complexas.Caso você, leitor, tenha me dado a honra de ler meu texto sobre a 10ª edição deve estar se perguntando neste momento: considerando a ação incessante desta revista, teriam os autores cometido o mesmo equívoco que na edição passada? Teriam privilegiado somente a ação esquecendo-se de dar a devida atenção à narrativa? É com grande alívio que lhes respondo com um sonoro NÃO! Felizmente o texto de Krueger volta a interagir com a arte de Ross e Braithwaite. Suas palavras complementam e concedem profundidade às pinturas da HQ. Se na edição passada o roteiro tinha sido reduzido a mero coadjuvante, na 11ª ele volta ao posto de protagonista, de onde não deveria ter saído.Então porque a nota 9,5 para a revista? Bem, esta explicação eu darei mais à frente. Por ora, falarei de dois pontos marcantes do texto de Krueger nesta edição. Tais pontos são os embates entre Adão Negro x Capitão Marvel e Sinestro x Lanterna Verde, os quais possuem algo em comum; a meu ver, com eles o roteirista pretendeu indicar o que define um herói e um vilão.O que torna alguém um vilão? Em que momento da vida um indivíduo, possuidor de plenas capacidades de desenvolver-se como pessoa, desvirtua-se do caminho da retidão e torna-se um perigo para todos que o cercam? Seria o poder o corrompedor desses indivíduos ou suas mentes já estariam maculadas anteriormente, quando seus corpos ainda estivavam desprovidos de força sobre-humana?No meu entender, no que tange Adão Negro e Sinestro, suas personalidades violentas nascem a partir do momento em que eles deixam de se considerarem como indivíduos, caso estejam desprovidos de seus superpoderes. Eles somente podem SER considerados indivíduos quando ESTÃO com seus poderes extraordinários.Há, no caso dos dois, uma inversão completa dos verbos ser e estar. Esse último verbo, que representa papel de complementar à condição de existência do indivíduo, demonstrando condição (física ou psíquica) e status (social ou econômico), transforma-se em elemento básico para o próprio conceito de existência. Suas mentes foram corrompidas de tal forma pelo poder ilimitado que se torna impossível vislumbrar o continuar da vida sem as benesses por ele outorgadas. Essa conclusão torna-se clara quando Capitão Marvel ameaça estrangular Adão Negro, caso este se recuse a proferir a palavra mágica que lhe retirará todos os poderes, e o vilão, tomado pelo desespero, suplica: “Não. Eu tenho estado... assim... nesta forma... faz tanto tempo”. Ao que Marvel replica: “Esse é o problema”. Ou seja, os anos que Adão Negro passou utilizando os poderes mágicos outorgantes de uma força inimaginável fizeram-no esquecer que antes de ser o portador dessa capacidade divina, era “apenas” um homem, com fraquezas e limitações. Assim, sua existência resumiu-se aos momentos em que utilizava seus poderes, sendo todo o resto apagado de sua mente.O mesmo pode ser dito de Sinestro; ao dizer que Hal Jordan não é nada sem o anel, Sinestro confessa sua própria dependência ao poder emanado do anel do Armeiro. Admite sua fraqueza e rebaixa-se à insignificância quando desprovido do poder soberano do anel outrora conferido. Por sua vez, Capitão Marvel e, principalmente, Lanterna Verde demonstram que o poder absoluto somente manifesta sua forma ilimitada em todo o seu esplendor quando emanado de um indivíduo com personalidade suficiente para entender que para ESTAR no domínio daquela força suprema é imprescindível SER um indivíduo dotado de um caráter íntegro suficiente para manipulá-la.Sinestro e Adão Negro sempre tenderão ao fracasso, pois crêem no poder como sustentáculo para suas existências, mal sabendo que ao fazerem isto reduzem suas vidas a um lampejo de supremacia que pode findar-se a qualquer momento, seja com um grito engasgado de uma palavra mágica seja com o apagar melancólico da luz proveniente de uma bateria.No meu entender, esses são os pontos altos do texto de Krueger nesta edição, porém, a narrativa não se limita a esses dois embates. A história avança e ganha contornos novos a partir desta 11ª parte, pois aquilo que se iniciou como um terrível sonho a atormentar os criminosos mais poderosos da Terra pode resultar na mais abominável verdade que já se abateu sobre os habitantes deste planeta. Braniac não se uniu aos demais criminosos da Legião do Mal para atingir seus objetivos nefastos, ele os usou. Não existiu um plano para fazer a vilania desmantelar a Liga da Justiça, apenas estratagemas desenvolvidos por Braniac para afastar a atenção de todos de seu real objetivo: a destruição completa de toda a vida da Terra, a fim de iniciar uma nova história, a gênese de uma nova raça, composta por seres geneticamente criados para serem perfeitos.Quanto à arte, há tanto a ser escrito sobre as pinturas de Ross e Braithwaite que faltam palavras para descrever o turbilhão de sensações originado da magnífica habilidade desses artistas. Cada quadro da revista é complexo. Esta edição não abre espaços para cenas singelas e simples, todos os desenhos realizados reproduzem feições, transmitem movimento e retratam a violência com uma perfeição irritante. Por mais que eu tente expressar para você, leitor, toda a plasticidade da ação imposta por Ross e Braithwaite durante esta edição, nada, absolutamente nada, se compara ao prazer de folhear esta obra-prima dos quadrinhos.Considero-me um leitor muito recente de HQ’s, porém já tive o privilégio de ter contato com várias obras-primas dos quadrinhos, mas nunca havia testemunhado tamanha competência na elaboração de cenas de ação (tanto em quantidade quanto em qualidade) como nesta 11ª parte da série Justiça, a qual encontra seu ápice na representação da luta entre a Liga da Justiça e o exército de Braniacs; não fui louco o suficiente para contar, mas posso garantir que a pintura de página dupla que reproduz essa luta contém mais de 100 personagens, todos interagindo entre si (e ao fazer isso, a maioria absoluta dos Braniacs perde algum membro!). Noção de profundidade, espaço, angulação, movimento dos personagens, tudo misturado no caos de uma guerra meticulosamente organizada por Alex Ross. Mas a perfeição não é medida pela quantidade de personagens retratados em uma página, tanto que outro momento memorável da revista é a luta entre Lanterna Verde e Sinestro, principalmente quando a bateria dos anéis do Armeiro, que cada um possui, esvai-se e o embate entre eles é resolvido à moda antiga, no braço mesmo. O efeito de cada soco desferido, dos chutes aplicados é devastador, tanto nos personagens quanto no leitor da revista.Para encerrar esta análise, cumpre esclarecer o porquê da revista não ter recebido a nota máxima, considerando todos os seus méritos narrados até o momento. Ao final do meu review sobre a 10ª edição da série, revelei meu temor sobre a possibilidade de dois assuntos não serem tratados pelos autores ou, caso fossem, não possuírem o devido espaço para seu desenvolvimento dentro da história. Esse temor está se concretizando.Se, por um lado, ainda não foi mencionado o fato dos heróis serem mal vistos pela população “salva” pela Legião do Mal, haja vista que para ela os vilões são os verdadeiros benfeitores, pois concederam uma nova oportunidade de vida sem suas deficiências naturais, por outro a utilização dessa massa de pessoas, por meio dos nanorobôs de Braniac, como exército para atacar a Liga da Justiça ocupou um espaço muito restrito na revista. Em duas páginas essa idéia é lançada e resolvida pelos autores, sequer há tempo para que o leitor possa sentir temor pelas pessoas que estão atacando a Liga, pois o problema é tão prontamente solucionado pelo Lanterna Verde que não chega a haver suspense, o que é uma pena.Entrementes, não posso deixar de ressaltar o grande desfecho da HQ. A história encerra com um estupendo gancho para a edição final, gerando (aí sim) um suspense enorme sobre o futuro da população libertada do controle robótico de Braniac, mas aprisionada pela insanidade dos gases produzidos pelo Espantalho.Espero ter justificado satisfatoriamente a nota concedida à revista. São problemas pequenos para uma obra tão grandiosa, mas mesmo assim precisam ser mencionados. É uma pena faltar apenas uma edição para o fim dessa saga que, com certeza, já tem o seu lugar reservado na história das melhores histórias já criadas para a Liga da Justiça. Há ainda mais uma parte da saga a ser apreciada, o epílogo desta viagem maravilhosa a que Ross, Krueger e Braithwaite nos convidaram, e nós acompanhamos fascinados por todo o seu trajeto. Que venha a última etapa, estamos ansiosos para desfrutar desta jornada um pouco mais.